top of page

não é mais fácil para quem decide

Atualizado: 9 de dez. de 2024


Mafalda Correia com o queixo apoiado na mão, pensativa

A separação e o divórcio doem.

Mesmo que seja a porta de saída de uma relação que há muito o deixou de o ser… ou que nunca o foi…



Mesmo que sejam a boia de salvação, de quem se lança borda fora de um contexto familiar violento e hostil.

A separação e o divórcio doem.


Mesmo quando o nosso corpo se expande de alívio e esperança.



Mesmo quando o coração volta a sussurrar «estás livre»…

 

- dói menos a quem quer divorciar-se?

- é mais fácil para quem toma a decisão da separação?

 


Não sei fazer a contabilidade do sofrimento, do deve e do haver do peso que afunda a alma, do aperto que estreita a respiração…



- a separação e o divórcio doem para quem os decide e doem para quem os recebe como já decididos - diz a literatura, diz a minha experiência no acompanhamento de pais e mães em processo de separação ou de construção do seu plano de coparentalidade, diz a minha vivência de passar por um processo de separação, com três filhos pequenos…

 

doem em medidas diferentes para quem está de cada um dos lados da notícia: do lado de quem a entrega ou do lado de quem a recebe.

Doem dores, dores minhas, dores tuas, dores nossas…

Doem.

Talvez mais do que as dores de quem as sente, a grande diferença está no momento que as vivem.

 

Do lado de cá da notícia, de quem a decidiu e a entrega, está a dor de um tempo que, muitas vezes, já se perdeu no tempo de compreender o que sente e quer, de juntar a coragem aos pedaços para conseguir avançar na vontade (às vezes, na urgência) de terminar o que dentro de si já terminou. Nem sempre capaz da gentileza que o momento pede, perde-se e desmancha-se de quem queria continuar a ser…


O tempo onde se perdeu, foi o tempo onde se achou, preparou… ou, melhor, foi o tempo onde se foi achando, preparando, separando… no gerúndio que foi caminho…



Do lado de lá da notícia, de quem a viu chegar, abrupta, bruta, estúpida… foge o chão, transformando-se em alçapão... fundo na perplexidade, na raiva, zanga, tristeza… afundando e emergindo na realidade desfeita, quem recebe a notícia conta o tempo como curto, rápido, cruel… um tempo que não deu tempo…

 

Dói fazer doer, dói ser doído…


E no caminho de desemaranhar o que já fomos, de deslindar o que seremos, quebram-se laços, atam-se abraços e vemos virar do avesso as dores a quem as dói…


...desmanchando e desfiando o que nos ligou, será tempo para tecer como nos vamos ligar, em pontos ponteados a quatro mãos… linhas invisíveis, novelos enleados, nós apertados, guardados, cortados…


Costurando, rasgando… fica a desdita do que seremos, anunciada neste doer... quando na dor de um, se sente a do outro, quando as tuas lágrimas salgam a minha boca, os tecidos costurados serão agasalho daqueles que fizemos nascer

 …quando a dor de um, aconchega o outro, quando as tuas lágrimas matam a minha sede, os tecidos retalhados serão abrigo esfarrapado daqueles que não vemos crescer

Comments


© 2020 by Mafalda Correia

My Site, My Voice, My Choice

Para receber mais informação...

Obrigada.

Thanks for submitting!

Get the content you need, just when you need it

bottom of page